quarta-feira, abril 12, 2006

O novo vizinho - Luana

A conversa com a Margarida tinha-me feito perceber que estava a cair num poço de onde me seria muito difícil levantar, mas não impossível. No entanto, eu precisava muito de um incentivo, qualquer coisa que me pudesse ajudar a perceber que também eu mereço ser feliz. Dei por mim a pensar que nunca me tinha sentido verdadeiramente amada...apenas sentia o meu corpo desejado por alguém que eu pensava amar, mas até mesmo o amor pleno era para mim desconhecido, pois nunca existira amor com confiança total, com entrega incondicional, e nunca me sentira respeitada. A minha vida era composta de “nuncas” e “nãos”. Senti-me suja ao conversar com a Margarida e ao contar-lhe algumas das porcarias de que o meu passado é composto. Ao subir para o meu andar imaginei-me criança de novo, quando o mundo dos homens era para mim desconhecido. Tive saudades dos meus pais, do carinho da minha mãe, que eu trocara por uma vida de podridão, e senti as forças faltarem-me. Deixei-me escorregar em frente ao 5º C e fiquei no chão, bem onde eu pertenço. Confesso que tive pena de mim própria e chorei. Foi nessa altura que um rapaz que não conhecia de lado nenhum se aproximou de mim sabe-se lá vindo de onde a oferecer-me ajuda.
A minha primeira reacção foi de raiva. Ele elogiou o meu nome, e eu pensei: “pois, mas Lana é o nome que eu te devia ter dado!”.
- Não, não quero ajuda nenhuma, nem sequer te conheço. Desaparece-me da vista!
- Hey, calma. Não te vou fazer mal... já me apresentei, sou o...
- Para que conste, não me interessa se és novo ou velho no prédio, não me interessa o teu nome e não, não vou aceitar a tua ajuda porque tu não me podes ajudar. Deixa-me!
Ele recuou dois passos e encostou-se à parede. Ficou ali, quieto, calado, a olhar para mim.
- Não tens nada mais interessante para fazer?
- Na verdade não. Gosto de ver uma rapariga a chorar nas escadas, com ar de quem acabou de levar com o Mundo em cima e precisa de alguém que lhe tire esse peso dos ombros, sobretudo quando ela me manda embora. Por isso vou ficar aqui, se não te importas.
- Deves ser completamente doido!
- Sim, completamente. E tu és a pessoa mais normal que conheço, porque choras e dizes que estás bem. Agora que já traçámos os perfis psicológicos um do outro, podemos recomeçar?
- O quê?
- Boa noite, eu sou o Bruno, sou novo cá no prédio. Estou a tentar conhecer os meus vizinhos. E tu és a...?
Comecei-me a rir. Aquele rapaz até estava a ser simpático, e eu estava a ser tão má para ele que me senti envergonhada.
- Ah, ela riu-se! Sinto-me feliz, já fiz alguma coisa de jeito hoje...
- Sou a Luana. Benvindo ao prédio. És sempre assim tão engraçadinho?
- Não. Só quando me sinto desajeitado....
- Pois, também me pareceu... Desculpa o mau feitio...
- Esquece; todos temos dias maus.
- Mudaste-te para cá hoje?
- Sim, pelo menos aqui estou mais perto do trabalho, e gosto desta zona. E tu, moras aqui há muito tempo?
- Alguns meses, só. Bem, espero que te dês bem por aqui. Vou-me embora.
- Já??
- Sim, já. É tarde. Boa noite, Bruno.
- Boa noite... Luana.

2 comentários:

Anónimo disse...

novos vizinhos, novas histórias.

Dóia Veloso disse...

sempre há pessoas determinadas
e que tentam fazer outras se sentirem bem...
Gostei da historinha...
;***