terça-feira, dezembro 09, 2008

DE VOLTA AO LAR

Bateram à porta suavemente. Ouviu mas, estava tão embrenhada no seu trabalho que, fez que não ouviu. Há algum tempo que preparava aquela proposta para apresentar no departamento de estudos arqueológicos da Câmara Municipal. Suspeitava de que, perto do lago, no parque do fim da rua existiam vestígios romanos muito interessantes. Falara no assunto ao seu mentor da Universidade e este incentivara-a a preparar um estudo prévio. Andava empenhada nisso. A campainha... deu um pulo no banco. Alguém tocava à sua porta. Levantou-se de mau humor a perguntar-se sobre quem seria àquela hora. Abriu. O Jorge, de mão levantada, preparava-se para bater novamente
- Desculpa Margarida... pensei que não estavas - Baixou-se, um pouco para a beijar no rosto mas ela agarrou-se-lhe ao pescoço e beijou-o na boca enquanto o puxava para dentro. Ele não se fez rogado e tentou apagar aquela paixão que o consumia.

Os corpos suados e as roupas espalhadas pelo chão a caminho do quarto eram o testemunho de um amor que tinha sido adiado mas que o tempo não tinha conseguido matar.
- Tantas saudades do teu corpo, do cheiro do teu cabelo...
- Deixa-te de coisas!... tens algumas explicações para me dar... Não se pode desaparecer e voltar de repente, assim sem mais nem menos...
- Tentei voltar para casa por causa da minha filha. Tentei a sério... queria, mesmo, que resultasse. Pareceu-me mais fácil desaparecer. Achei que, ficando com raiva de mim, me pudesses esquecer e seguir com a tua vida em frente...
- Não tinhas o direito de pensar por mim nem no que seria melhor ou pior...
- Pois... desculpa... O tempo passou e as coisas em casa pioraram mais e mais... acabei por perceber que nos estávamos a destruir e a acabar com qualquer resto de respeito que tivéssemos um pelo outro e do qual necessitávamos para criar a nossa filha. Por isso resolvi sair de casa. Há algum tempo que vivo num pequeno hotel perto daqui. Tenho-te visto e pensado naquilo que tínhamos...
- Queres voltar para casa?
- Posso? - e os olhos riam-se-lhe.


Margarida

sábado, novembro 15, 2008

BAHIA E ORIXÁS

Levantei-me. Estava furiosa. Dei meia dúzia de voltas pelo pequeno jardim. Passei por casa da Margarida e bati à porta.
- Calma! Onde é o fogo?!
- Desculpa...bati com muita força?
-Xiiii!... Que é que se passa? Já vi que estás a precisar de um dos meus chás de frutos vermelhos...
Segui-a até à cozinha sentando-me num dos bancos altos - Palerma... maluco... convencido... idiota...mentiroso...covarde...
- A quem é que se referem todos esses mimos?
- Ao asno do Afonso.
- Que é que ele te fez?
- Nada.
- Nada?!- Nunca me contaste o que se passou no Brasil... partiram os dois tão felizes para voltares sozinha e infeliz.
- Nunca te contei porque queria esquecer... Os primeiros tempos foram maravilhosos. Salvador é uma cidade muito bonita e a Bahia não lhe fica a dever nada. As praias, quase desertas, da costa do cacau, de Dendê, dos Coqueiros, dos Descobrimentos, as imensas pequenas ilhas da Baía de Todos os Santos, as cachoeiras da chapada Diamantina, Lençóis... e a cidade de S. Salvador da Bahia?! E o pôr-do-sol junto ao Forte?! Tudo tão bonito, tão perfeito... Passado algum tempo começámos a frequentar o terreiro das mães de santo. O Afonso sentia-se fascinado pela mistura do cristão e do pagão, das cerimónias brancas realizadas pela noite povoada de orixás. A principio íamos os dois mas, como eu sou um bocado descrente e as cerimónias, para mim, não passavam de folclore, o Afonso começou a sentir-se pouco à vontade com a minha presença. Achei melhor deixar de o acompanhar nessa parte do seu mundo. É verdade que nunca me pediu que o fizesse mas também nunca insistiu para que o acompanhasse. Pareceu-me, até, ficar grato quando lhe comuniquei que não voltaria com ele aos rituais. Chegava altas horas e, não raramente, quando eu me estava a levantar para uma qualquer excursão. Deixou de ir comigo. Andava cansado. Necessitava de dormir durante o dia. Certa vez, em que voltei ao apartamento porque a excursão tinha sido cancelada por o mar estar com ondulação não apropriada à pequena embarcação que nos iria levar até ao Morro de S. Paulo, encontrei-o a dormir com duas jovens. Acordou estremunhado quando me sentiu entrar dizendo que não era aquilo que eu estava a pensar. Fiz as malas e voltei nesse mesmo dia para Portugal.

Marisa

quarta-feira, novembro 12, 2008

O JARDIM

Continuava deitada no meu balancim aproveitando os últimos raios de sol do entardecer. Os olhos fechados e o pensamento divagando para longe. Assustei-me quando o cão rosnou baixinho
- Incomodo? - Abri os olhos. O Afonso, na minha frente, fixava-me - Posso?
- Claro. Tens aí uma cadeira.
- Fizeste um belo trabalho aqui?
- Fiz?! Como é que sabes que fui eu?
- Foi a D. Margarida que me disse quando tentou converter-me a usurário da tua caixa de compostagem.
- A melhor embaixadora da caixa! - ri-me - Convenceu quase todos os habitantes do prédio a contribuírem com os restos das suas cozinhas. Tudo o que cresce aqui, neste jardim, é fruto da minha agricultura biológica. Nada de adubos químicos ou pesticidas.
- Para que são estes canteiros no centro?
- Para as plantas que cresceram demasiado, dentro das casas e, das quais as pessoas se queiram desfazer.
- Boa ideia!... O teu cão continua a rosnar-me... desde aquele dia em que nos embrulhou no hall... (para sempre)
- Que disseste?
- Nada - levantou-se ficando muito próximo. De repente pensei que me ia beijar mas... deu meia volta e saiu.

segunda-feira, novembro 10, 2008

AMIGOS

Desci as escadas vinda, mais uma vez, de casa do Mário. Passei à minha porta e ouvi o cão ladrar mas segui caminho. Apetecia-me um café a sério ( o Mário continuava a servir café de cafeteira). Não fiquei muito tempo. Sentia-me inquieta. Há algum tempo que andava assim... Voltei a casa, peguei numa garrafa de água e voltei a sair com o cão atrás. Fui até ao jardim das traseiras e estendi-me no balancim. Estava calor. Fechei os olhos... Desde que o Mário se mudara para o prédio havíamo-nos tornados inseparáveis. Passávamos horas a conversar. Aos poucos fomos descobrindo que, apesar da diferença de idades, tínhamos imensas coisas em comum. Éramos amigos embora, por vezes, tenhamos tido a tentação de ir mais longe. Havia algo que me impedia de prosseguir. Custava-lhe entender(acho que a mim também). Talvez tivesse medo de perder aquela amizade, que ao encetar um outro caminho esse não tivesse retorno. Sabia que não queria perder aquele amigo, isso, eu sabia...

quarta-feira, agosto 13, 2008

Primeira noite no prédio

O meu nome é Pedro e sou o novo vizinho do último andar.
Acabei de me mudar. A noite está calma e a lua em fase crescente. Daqui a três noites será lua cheia...
Da janela do quarto consigo vislumbrar a sua pálida cor e sinto a suave brisa da noite a acariciar-me o rosto. Fecho os olhos e peço á lua, minha eterna companheira, que me acompanhe nas noites mais escuras desta nova fase da minha vida... mesmo quando estiver em fase de lua nova, pois sei que estará lá... como sempre esteve desde o primeiro dia da minha vida...
A trama da minha vida é como a de um livro absurdo, onde o que devia estar no princípio acontece depois. E esse livro é meu e não fui eu que o escrevi, já estava escrito: simplesmente cumpri-o página a página, sem dizer nada. Sonho escrever a última, pelo menos de um só fôlego, pela própria mão, mas os sonhos sonhos são, e às vezes nem isso...

quinta-feira, julho 10, 2008

Para a Marisa – Afonso Vilhena

Todo o ser humano é um abismo profundo de si próprio. Passamos a vida, a maioria dela, pelo menos, a tentar encontrarmo-nos, e quando o conseguimos – se o conseguimos de todo -, é para voltarmos novamente a perdermo-nos, como num jogo de cabra-cega. Já estive nessa situação tantas vezes, e de todas consegui voltar a mim, bastando para isso olhar bem para dentro e permitir-me sentir com toda a intensidade, com toda a dor, com toda a violência possível, todos os sentimentos que estavam tolhidos bem no âmago do meu ser, até eles se soltarem e eu voltar a ser apenas eu, livre, renascido, feliz. É por isso que volta e meia a solidão se torna um imperativo, o recolhimento uma necessidade, a quebra de contacto com o mundo exterior um dever e uma obrigação. Desses momentos – que chegam a durar meses – resultam também folhas escritas que encerram os pedaços mais íntimos e secretos da minha alma, pois ao lê-los descubro sempre algo de novo a acrescentar à minha auto-definição.

Ah, Marisa, como eu quero que compreendas isto! Nunca me escondi de ti. Esperei que descobrisses os espaços em branco daquilo que não te contei, para que tu própria me pudesses definir à luz dos teus olhos, da tua alma, mas não, não me escondi de ti. Também tu deixaste espaços para eu preencher à medida que te conhecia, e são esses os mais bonitos, os mais especiais, aqueles que guardarei para sempre: a forma doce e inconsciente como colocas o cabelo atrás da orelha quando os teus olhos brilham de admiração por algo que consideras belo, como um pôr-do-sol no mar ou a neve a cobrir uma montanha; o calor do aconchego dos teus braços, que parece dizer “Eu estou aqui, sou tua”, mesmo que com o teu jeito meio envergonhado nunca o tenhas dito tão abertamente; o teu ritual de olhar para trás a ver se te esqueceste de alguma coisa quando sais de casa, do café, do cinema…

Mas tens de entender. Preciso que entendas. Faço parte de um mundo em que as coisas não são a preto e branco, em que a realidade é algo muito subjectivo… um mundo que nem todos aceitam ou compreendem. Não tens de gostar desse mundo por eu fazer parte dele, não quero que mostres interesse se ele não for genuíno, e não vou falar-te dele enquanto não me perguntares. Aceito-te como tu és, como um campo de trigo aceita uma semente que, transportada pelo vento, ali encontra o seu lugar e, ao desabrochar, se revela uma flor. Portanto, não se trata de ti, mas sim de mim.

Pedi-te um tempo porque precisava de olhar para dentro de mim, de compreender os sentimentos, as experiências… e sim, porque precisava de precisar de ti, de sentir a tua falta. Talvez o tempo tenha sido demasiado para ti, talvez esta carta encontre apenas o vazio no teu coração, mas esta é a altura certa, a única em que te poderia dizer isto.

Marisa.

Estou aqui. Sou teu.

domingo, junho 29, 2008

NOVIDADES (OU NEM POR ISSO)

- Antes de mais nada quero que saiba que estamos muito contentes com o seu regresso. Seja muito bem-vinda! Queria, então, saber novidades... pois também estive fora durante algum tempo. Acabei o meu curso e continuo ligada a alguns projectos de investigação arqueológica da Universidade mas, como calcula, não dá para viver disso assim resolvi manter o meu lugar de porteira do prédio. Poder continuar a viver aqui também pesou muito nesta minha decisão. A Joana está na escola e não é muito bom para ela andar a saltitar de campo para campo enquanto eu me dedico às minhas escavações. Quando calham em período de férias levo-a comigo de contrário fica com a Marisa - sabe quem é? - a vizinha aqui do lado.
- Claro que sei. Ainda continua a fazer partos em casa das parturientes?
- Poucos, penso eu. Não são muitas as pessoas que, tal como o Dr João e a esposa, correm os riscos de querer que os filhos nasçam em casa. De qualquer modo, a Marisa ficou muito triste com a morte do bebé da Rita e do João...
- Chegaram a saber as causas dessa morte? - Foi muito triste para todos!
- Sim, muito triste. Morte súbita, segundo a autópsia - respondeu Margarida
- Que é feito desse casal?
- A Rita tinha ido para casa dos pais, pois não conseguia superar a morte do filho. O João... acho que está a trabalhar em França (se não estou enganada). O apartamento está vazio mas não para venda. Não sei se algum dia voltarão! Há um vizinho novo, veio sozinho com a gata. Parece-me que veio por indicação do Dr João. Eram colegas de Serviço.
- Muito me conta!- exclamou a Luana- É giro esse tal...como é que se chama, mesmo?
- Mário Ventura e vive aqui por cima, no 1º esq.
- Sim senhora... e mais novidade?
- A minha amiga Marisa parece que não anda lá muito bem com o Afonso Vilhena. Foram juntos para a Baía e, não sei que se passou por lá que ela veio com uma conversa de que se estavam "a dar um tempo". Achei imensa graça a esta expressão!...
- Deve ter sido dos orixás - gracejou a Luana. Aqueles dois foram feitos um para o outro... sou eu que lho digo, Margarida!
- Não sei não... agora só vê o jardim das traseiras. Tem ali uma obra de arte. Aquele pátio que não passava de um pedaço de cimento, onde o cão esticava as pernas e fazia as necessidades está um verdadeiro èden! Mais um pouco de chá?
- Sim, obrigada. Adoro este seu chá de frutos vermelhos. Imagine que até tive sdaudades dele... Voltando às novidades...Tenho de ir ver a tal obra de arte ambiental.
- Sempre a mesma... vai ver que tenho razão. Ah, temos um novo inquilino no 5º esq (e senti-me corar). Chama-se Acácio Martins e é bancário. Vive sózinho com filha.
- Muito bem informada - sorriu a Luana
- Pois... - e fiquei um pouco atrapalhada- a Joana e a Lurdinhas, a filha dele, são muito amigas - e o sorriso saiu-me amarelo.
- E que mais novidades temos por cá? - A Luana deve ter-se apercebido mas fazia de conta que não notava para me deixar mais à vontade.

sexta-feira, junho 27, 2008

Regresso - Luana

Entrei no prédio e olhei em volta. Parecia estar tudo bem agora, já não havia aquele cheiro a queimado e a... à ameaça da morte. Mas também já não havia a decoração em que eu participara e de que gostara tanto. Esta parecia-me mais... despida, mais impessoal.


Pousei as minhas duas malas no hall de entrada e esperei até a D. Margarida aparecer.
- Luana! Então, como estás? Pensava que não irias voltar!
- Mas aqui estou, D. Margarida. Como está tudo por aqui?
E ela contou-me. Contou-me como a vida do prédio se desmoronara, como as pessoas tinham desaparecido. Contou-me também como novos inquilinos tinham chegado e começado a encher de uma nova força este espaço. Deu-me um abraço e eu senti-me em casa.
Renascida. Feliz.
Depois de ter estado tanto tempo fora, pensei que teria medo de voltar e enfrentar alguns fantasmas, mas agora estava mais forte.
Passei muito tempo na Escócia, a desenvolver um trabalho de investigação para a Universidade, e adorara. Não só me embrenhara no trabalho como fizera também alguns amigos, bons amigos, e nunca sentira, durante o tempo em que permaneci ali, a necessidade de me castigar com engates ou com cortes no corpo. Essa parte de mim parecia ter ficado em Portugal, no passado, e eu queria agora viver o presente, só o presente, e tentar gostar da minha vida.
Subi ao meu quarto e desfiz as malas. Depois voltei a descer pelo elevador e bati à porta da D. Margarida, que logo me convidou a entrar e tomar um chá.
- Conte-me - pedi - Quero saber todas as novidades.

sexta-feira, junho 06, 2008

MARGARIDA

O tempo passa sem quase darmos por ele... A joana entrou para a escola e tem-se dado muito bem. Daqui a algum tempo estará de férias. Anda feliz da vida pois, finalmente, encontrou no prédio, uma amiguinha quase da sua idade. Ela e a Lurdinhas dão-se tão bem que parece que se conhecem desde sempre. Passa a vida em casa dela. Quando estão juntas esquecem o tempo pelo que, a maior parte das vezes, tenho de subir até ao 5º esq. Confesso que o faço com prazer... Dou comigo a desejar que a joana esqueça as horas para ter uma desculpa para tocar aquela campaínha...

Margarida

segunda-feira, março 31, 2008

BEATRIZ E O CÃO

-É seu este gato?! - perguntei quando a porta se abriu a uma cara ensonada, de cabelo desgrenhado.
- Beatriz!!!! Que aconteceu? - parecia preocupado
- Deve ter caido da varanda.. ou saltado... sei lá - respondi entregando o gato que pelos vistos era uma gata- Tenho-a visto a desafiar o meu cão, do parapeito da varanda, que costuma ladrar-lhe do pátio. Há pouco ouvi-o, mais furioso do que nunca, e fui ver o que se passava. A sua gata estava a um canto, escondica entre dois vasos, toda eriçada a bufar enquanto o cão a tentava abocanhar.
- Coitadinha da minha menina!... Que grosseria da minha parte... Toma um café?
- Até tomo, obrigada - disse eu enquanto entrava a um sinal do meu vizinho. O hall tal como a sala estavam completamente vazios, sem um unico móvel. Na cozinha havia, apenas, dois bancos altos encostados a um balcão.
- Que cabeça a minha!... não trouxe a máquina de café. Pode ser chá?
- Sim, claro

sexta-feira, março 28, 2008

Acácio Martins - 5º Esquerdo

O meu nome é Acácio Martins. Tenho 35 anos e sou funcionário bancário. Estou separado e sou pai de uma filha, na realidade não sou o pai biológico, casei com a Albertina já ela estava grávida e assumi a criança como se fosse minha. A Lurdinhas já tem 10 anos é uma menina muito bonita e inteligente e não sabe que eu não sou o pai dela. Olha para mim e chama por mim como se eu fosse o seu verdadeiro pai e de facto até me sinto como tal. Fui em quem lhe mudou as primeiras fraldas lhe amparou as quedas e lhe secou as lágrimas; fui em quem lhe deu a mão antes da chegada do sono contando vezes sem fim as histórias dos ursinhos e da branca de neve. A Albertina teve uma depressão pós parto e não conseguiu cuidar da Lurdinhas. Começámos a discutir, a Albertina saiu de casa nunca mais voltou. Não sei nada da Albertina há 9 anos. Não sei se é viva, se é morta. A Albertina não tem família além de um pai esquizofrénico com um historial violento que está internado no Hospital Miguel Bombarda há 20 anos. Não sei onde poderá estar e confesso que também não me interessa mais saber do seu paradeiro. Vivo no 5º Esquerdo.

segunda-feira, março 17, 2008

MÁRIO VENTURA

Sou novo no prédio. Acabo de me mudar para o 1º esq. com vista para o pátio das taseiras.
Há uns tempos que havia ouvido falar deste prédio. Fui colega do João. Trabalhávamos juntos no hospital. Éramos amigos. Vivi com ele as suas inseguranças, a felicidade que a gravidez da Rita lhe trouxe,a tristeza da morte do filho e a decisão de abalar para Paris, aceitando a proposta de estagiar num Hospital Pediátrico.Soube que, entretanto, a Rita foi viver para casa dos pais.
Estou separado. A minha mulher, médica como eu, estava casada com o emprego. Havia dias em que nos víamos, apenas de passagem, no hospital.Almoçar ou jantar juntos? De vez em quando na cantina do hospital. Já não aguentava aquela vida... Peguei na Beatiz, a minha gata - a única femea a que algum dia fui fiel- meti algumas roupas na mochila e eis-nos aqui neste primeiro andar.Por enquanto não estou interessado em grandes aventuras por isso este ambiente calmo serve-me que nem uma luva. Bem...a calmia é quebrada pelo ladrar furioso do cão do pátio quando se vê desafiado pela Beatriz a espreguiçar-se no peitoril da varanda. Se ele a apanhasse...

Mário Ventura

quarta-feira, março 12, 2008

DE VOLTA PARA A RECONSTRUÇÃO

Cá estou eu de volta com o meu curso quase terminado. O tempo passou depressa ( tão depressa ou tão lentamente ) que vim encontrar o prédio quase em ruínas. Nem sei por onde começar... A explosão do último andar e o incêndio que se lhe seguiu deixou o prédio quase inabitável. Muitos foram os inquilinos a deixar as suas casas, uns estão a viver em casa de familiares e amigos outros foram-se embora de vez. Ainda não tive tempo de me inteirar, verdadeiramente, da situação. É tempo de reconstrução, de ver o que se pode aproveitar, de limpar, de tornar o prédio tão acolhedor como já foi.
Depois da reconstrução passaremos a vender ou a alugar os apartamentos, à medida que estiverem em condições de serem habitados. Voltei para a portaria, onde me podem encontrar a desempenhar, também, o papel de administradora. Aí me podem contactar ou deixar os recados na minha caixa do correio (mar.mar@sapo.pt)

Margarida